Memórias de uma abelhinha de Irati

Tudo vale a pena quando a alma não e pequena

Meu Diário
26/02/2017 18h44
Banhão e Bainha

Eram dois irmãos;filhos do Amantino Banha,por isso eram conhecidos assim pelo bairro,:Banhão e Baínha.
O Banhão se chamava Dirceu e o Baínha,Juarez.
Crescemos juntos,pois nosso bairro mais parecia uma pequena aldeia,onde tôdos sabiam de tôdos,das suas dificuldades,das suas conquistas ou fracassos.
Desde muito cedo, eles começaram trabalhar batendo caixas na fabrica do Aleixo,pra armazenar batatas do depósito.
Isso era constante,pois batatas em Irati era o que mais tinha,por isso, trabalho não faltava prá piazada e até eu mesma,de vez em quando, dava uma mão pro Tio João, pai da Sirlene.
Era ele quem supervisionava e pagava,na hora de entregar as caixas prontas.
Ao completar seus 18 anos,Banhão estava radiante,pois iria prestar o Serviço Militar em Curitiba, seu sonho era ser bombeiro.
Certo dia,ao passar por ele,debruçado numa janela,me viu fumando e me repreendeu dizendo:
Não fume,faz mal pra saúde e completou:
Eu quero viver bastante,vou ser bombeiro na capital, pra dar uma casa prá mãe Noêmia.
Meio sem jeito, sorri prá ele e desejei boa sorte.
Tempos depois, ele foi em busca do seu sonho;
passado algum tempo, veio a trágica noticia da morte do Banhão,num acidente fatal,ao cair do caminhão,numa ocorrência de socorro.
A comoção pelo bairro foi geral, ao ouvir os gritos desesperados daquela mãe,cujo filho foi em busca de uma casa pra ela e voltava dentro de um caixão.
Baínha ficou só, restara ele porém, pra continuar ajudando aquela sofrida mulher.
O legado que ele lhe deixara, foi cumprido finalmente.
Com o dinheiro do seguro recebido,pode então ela, dona Noêmia, comprar sua casinha a beira da linha,onde cada vez que passava pela Rua Antonio Lopes, bem próximo a Laminadora,lá estava ela na janela.
Olhar perdido no horizonte,como se estivesse vendo aquele filho querido, que a vida lhe dera e a morte levou, ainda tão jovem.
Certa vez parei pra conversar e ela me disse:
A vida é assim mesmo polaquinha...era assim que as vezes me chamava.
Meu Banhão foi embora,mas foi feliz, ele queria tanto ser bombeiro.


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 26/02/2017 às 18h44
 
26/02/2017 12h05
Bateu o rafaé...

Era costume na época em que era criança, ouvir isso com freqüência, sem imaginar sequer o que significava tal ''palavreado.
Certo dia,no meio da conversa cotidiana, entre minha mãe e nossa vizinha mais proxima ,NhaDavina, a mãe do Ubaldino e do João Maria, ouvi ela dizendo:
Comadre de Deus,bateu o Rafaé na casa da Jarda...
E minha mãe respondia:
- Que barbaridade!
Pobre Jardelina,esse era o nome da Jarda,que morava bem pertinho do campinho do sepilho.
Eu ficava ali de butuca, pra descobrir o que seria aquilo.
Quem era afinal esse tal Rafaé,que batia na casa dos outros, e até na casa da Jarda...
Mas a conversa acabava ali, e outro assunto entrava ´´na conversa vai ,conversa vem´´
Dali uns dias,lá vinha Nha Davina de novo, com a mesma frase...
Bateu o Rafaé...

Não conseguindo descobrir por conta o que era aquilo, resolvi perguntar pra mãe e ela me explicou que:
O Rafaé não era uma pessoa e sim um acontecimento, por falta de alguma coisa ou no caso a comida,que ficava escassa e acabava faltando de um momento pro outro.

A partir dessa explicação, passei a adotar o tal Rafaé, sempre que começava faltar algo em nossa casa, e de repente, virava brincadeira.
E era assim que driblamos muitas dificuldades sorrindo.

Cidade pequena leva essa vantagem.
A solidariedade nos momentos de apuros,quando se batia a porta do vizinho pra emprestar uma xícara de café ou açúcar, se comprometendo a devolver depois,pois era um compromisso assumido,mesmo porque, se não pagasse,não teria ajuda na próxima vez que o Rafaé batesse, fato que era bastante corriqueiro.

Graças a essas lições de vida da infância,aprendi a respeitar sempre compromissos assumidos.
Aprendi tambem que as diferenças sociais que hoje predominam,não chegam perto das carências dos mais pobres de outrora.


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 26/02/2017 às 12h05
 
26/02/2017 11h53
Brincadeiras no sepilho

Adão Meister,
Duda,Bôca
Luiz mico,Ubaldino,
Aglair,Jeca e Cuco,
joãozinho,Motorzinho,
Ade e Ito,
Bolacha e Piamada.
 Eram alguns dos craques do sepilho.

O espaço era coberto de sepilhos.
Era o cenário que servia de campinho de futebol,pra piazada dos Santos Aleixo.
Ficava próximo á Capelinha das Canisianas, e até mesmo os adultos a caminho da novena, paravam pra espiar qual time estava ganhando.
Na verdade,era somente um treino amistoso ''entre dentes de leite'' do ISAL, mas se esforçavam como quem já fossem profissionais.
As moçoilas da época, ficavam um pouco afastadas, prá ''não dar na vista'',mas todas tinham alguma queda pelos esforçados jogadores.
Por ser muito alto,o grandalhão Duda,filho do seu Palmiro, ficava na trave ou no gol,como se costumava dizer.
Os demais meninos se dividiam, entre eles estava o loirinho Adão, irmão da Maria Meister,minha amiguinha.
Também o Luiz Mico e seu primo Aglair, marcavam presença.
Os irmãos Cuco e Jeca, Ade e Ito, e também o Joãozinho da Talica,que gostava de cantar as  músicas do Nelson Gonçalves.
Motorzinho e Bolacha, Ubaldino e Leta da nhá Dula,Banhão e seu irmão Baínha.
E o meu favorito Piamada,entre tantos outros, cujos nomes já não recordo mais, apesar de lembrar das fisionomias.
Todas as meninas ficavam na torcida e vez em quando, se afastavam pra catar guabirobas no mato do Budell.
Eram abundantes naquele local...
Próximo ao Sepilho,ficava a casa dos Barricas,onde costumeiramente a meninada se reunia, pra assistir o teatrinho da Polaca,sempre aos sábados á tarde, indo depois assistir um filme de 'verdade'' no cinema do ''seu João'.
Eram dias e tardes gostosas aqueles finais de semana, com uma brisa soprando de leve, agitando corações.
 
Vez em quando, aproveitava a oportunidade, pra visitar minha amiga telefonista,Eunice, filha da Edite ´´costureira de mão cheia´´,que morava perto da marcenaria do primo Dirceu, irmão da prima Sirlene.


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 26/02/2017 às 11h53
 
25/02/2017 21h41
O barracão...

Quantas histórias couberam ali,naquele barracão da fábrica do Aleixo.
Era tão grande,que ao circular por ele,parecia não ter fim,com seus trilhos de vagonetes,que vez em quando carregavam a criançada,em direção á serraria.
Não foram poucas as vêzes que tambem fiz essa proesa, sem imaginar o perigo que rondava, caso descarrilhasse.
Gostava muito de sentar-me sôbre uma pilha de madeiras,pra ver tudo lá do alto, enquanto não chegava um novo caminhão de outras serrarias,pra ali descarregar.
Vez e outra, pairava ali um ar festivo, quando então chegavam não sei de onde,um grupo de ciganos ou bugres,que ali acampavam, tornando nosso pequeno Bairro aldeia mais alegre, saindo da monotonia...
Eles dançavam e cantavam até altas horas, como se nada os incomodasse e não tivessem problema algum.
Ali também era o ponto de encontro dos casais enamorados, que na inocência dos anos 60, davam as mãos, com certa timidez e muito brilho no olhar, como a querer dizer que já era o bastante.
Muitos ali marcavam se encontrar  pra trocar ''gibis'', como faziam o João Pedro e Orlando, os filhos da dona Hilda,uma mulher valorosa, que criou sozinha seus 6 filhos com o pouco recurso que ganhava, escolhendo batatas nas Cerealistas.
Tambem eu, costumava emprestar revistas da Lurdinha da ´´nhá Rosinha´´,uma valente baixinha,que sofria as consequências de um marido alcólatra, o seu Quinzinho.
Em dezembro de 1961, quase perto do natal, ocorreu o grande incêndio do Gran Circo Americano em Niterói, e a manchete na revista O Cruzeiro, passou de mão em mão ali naquele barracão.
Foi nessa mesma época, dias depois, que uma tragédia local aconteceria ali,entre aquelas pilhas de madeiras,quando uma delas desmoronou, e matou uma inocente criançinha, que ali brincava,um garotinho chamado Guchinho.
Além de ter ferido em outra ocasião, o Leta, o filho da nha Dula, que caiu do vagonete em disparada, ficando com cicatrizes pra sempre no rosto.

O tempo correu célere...
''o barracão não mais existe,mas suas histórias, povoadas de lembranças,ficaram pra sempre gravadas, em minha memória''


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 25/02/2017 às 21h41
 
25/02/2017 21h13
O vestido e o jornal

Todo final do de tarde, meu pai costumava ler o seu jornal.
Então, mandava que fosse até a fábrica dos Varella, pegar com seu Alexandre Buckmann,que após ler o dito cujo, gentilmente repassava o exemplar pro pai.
Nunca soube entender direito, aquela troca de leitura do mesmo jornal,porem de duas uma:
Ou o pai não gostava de comprar ou então,vinha de outra cidade,especialmente pro Buckmann.
Costumava ler os jornais da época, como A Tribuna, mas aquele era realmente muito especial, a ponto de não falhar um dia sequer.
Na primeira vêz que cheguei nos Varella, fiquei intimidada com a figura daquele Senhor distinto,que me olhava sem entender o que fazia ali.
Conseguí dizer baixinho:
-Vim pegar o jornal.
E ele sorrindo da minha timidez,entrou na sua sala e voltou, com o misterioso jornal, que rapidamente peguei e saí correndo, quase tropeçando nos passos.
Justo naquele dia,estava usando pela primeira vêz o vestido  de bolinha, que ganhei da dona Talica, a mãe da Lurdinha.
Ele me serviu direitinho...como se fosse feito sob encomenda.
Sempre me lembrarei com gratidão e muita saudade, daquele vestidinho de bolinhas.


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 25/02/2017 às 21h13



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