Eles merecem uma página a parte, pelo muito que significaram em minha vida.
Além de avós,foram meus padrinhos de batismo, em casa, e meu avô me chamava de ''mirim.
Depois dos meus pais, foram os que mais quis bem, afinal fui neta afilhada.
Gostava de ficar escutando os causos do vovô, enquanto comia, as broas da vovó, feitas sempre com batatas e assados naquele forno de fundo de quintal, debaixo do pessegueiro.
Formavam um casal engraçadinho, sendo ele um bugrinho, moreninho e franzino,que gostava de sentar e erguer uma das pernas no banco,enquanto pitava o ''paiova'', feito de palha;
Pra isso, tinha sempre fumo de rolo, secando na caçambinha.
Era muto proseador:
Contava tantos causos, parecendo tão verdadeiros, que faziam a imaginação voar longe,ia maginado cena por cena.
Nhá Catarina, era robusta, muito clarinha,olhos azuis e o cabelo sempre trançado,preso num ''coque'' no alto da cabeça,
Como legitima polaca; descendente de uma familia abastada de Contenda, largou tudo, pra seguir aquele moreninho, que era empregado da fazenda do seu pai André.
Não aceitando o casamento, o jeito era fugir, pois aquele bugrinho encantou o seu coração.
No dia da fuga ,ele a colocou na garupa do cavalo e foram em busca da felicidade, viver aquele amor, que parecia jamais dar certo.
O preço pago pela noiva deserdada, perdendo a herança paterna, foi compensada pelo amor da familia, que dali surgiu,
Tocaram a vida e tiveram muitos filhos, entre eles meu pai Antonio.
.
No final de cada dia,sempre que acabava a ''Voz do Brasil, ela saía na porta e gritava:
- Vem comadre,já vai começar a novela.
As novelas de rádio na época, eram Serra Brava e A maldição do Solar Vermelho e o Direito de nascer.
Eram os únicos a ter rádio na familia, e ficavam felizes, quando todos se reuniam na sala, em torno do aparelho, e sem conversar,ficavam atentos ao desenrolar da trama.
Não havia banheiro naquela casa,o banho diário era de ''tina ou coxo, como costumavam falar os de ''dantes tempo,''com direito a tomar um bom café, coado no coador de pano,acompanhado de pão com banha de porco.
Eu costumava ficar lá até a noite,sentada sobre o velho balcão de guardar mantimentos, ou sobre o caixão de guardar lenhas,ouvindo as intermináveis conversas das comadres.
Certo dia,a fortaleza que tinha o nome de Catarina, adoeceu,
Ficou fraquinha,mas muito religiosa, costumava se ajoelhar pra rezar o Terço, em frente a imagem da Santinha, Padroeira dos Poloneses, Nossa Senhora de Czestochowa.
Acho que foi dela, que herdei essa minha religiosidade, esse fervor religioso.
Mesmo assim,nunca mais recuperou sua saúde,consequencia quem sabe, da juventude sofrida, trabalhando na lavoura e logo após, já casada,teve que fugir muitas vezes do vovô, quando ele embravecia; chegou ela até subir em árvores e com isso adquiriu uma hérnia, que a incomodou a vida tôda.
Passado algum tempo sobre a cama, veio a falecer, deixando só o seu bugrinho.
Não sei se por arrependimento ou pela saudade, ele mergulhou na bebida.
Um dia, andando pela linha do trem,recebeu uma pancada de um vagão em movimento, quase fatal.
Desde então, já com dificuldades pra andar,costumava pedir-me pra fazer compras no Armazem do Sierakoski ou no Galicioli, mas quando ele pedia pra ir no açougue do Bihaico,eu não queria ir sozinha, tinha medo,pois contavam que lá,tinha um ''alçapão'',onde as pessôas podiam cair,como comentavam as comadres do lugar..
A partir dai,nunca mais ele foi o mesmo.
Ficou depressivo por algum tempo e partiu tambem,talvez com esperança de encontrar aquela moça tão bonita e decidida,que um dia ele roubara na garupa de um cavalo e que nunca esqueceu.
Por certo apesar de tantos erros, fôra redimido ao salvar da morte certa, o menininho Jeferson, filho da dona Pedrina, que um dia ficara caido muito próximo a um fio de luz que rebentara,e ás pressas, socorreu aquela criança.
Belo gesto que o tornou um HERÓI desconhecido.
Esses foram meus avós; Catarina e Hipólito, dos quais descendo pelo lado paterno.