Memórias de uma abelhinha de Irati

Tudo vale a pena quando a alma não e pequena

Meu Diário
30/01/2017 21h02
Memórias de uma abelhinha de Irati

 

Diante de uma folha em branco,um mundo de palavras se descortinam em nossa mente,e quantas coisas se pode escrever,num momento de solidão
Os dias passam,as horas passam e as noites torna-se intermináveis,como intermináveis são as divagações...
São lembranças desde a infância,até o apogeu da velhice,que movem esse desejo de tornar as palavras cravadas na mente, como numa concha no fundo do mar.
Da infância até a velhice, se estende uma longa ponte invisível,no túnel do tempo.
Recordações vão jorrando feito mel, que escorre lentamente do favo,ora adocicadas,ora menos doce,desaguando toda na velhice,o ultimo estágio.
É necessário escarafunchar os fatos,item por item,pra que nada se perca,quando o assunto é:
Nossa Vida...
Todos tem suas histórias de vida,do nascer ao morrer,com os altos e baixos,risos e lágrimas,dores e desamores.
Quando muito pequena,era por demais calada, por certo observava o mundo
na expectativa do que haveria de vir na mocidade.
O aconchego do lar modesto,muito contribuiu pra tanto mutismo
Por não haver muito a observar ou admirar e muito menos esperar,diante da pobreza extrema,com mil carências e nenhuma chance de mudar. 
Sentada junto a tosca mesa de madeira bruta,observava o vai e vem dos pratos rasos esmaltados,com a indiferença de quem nada entende da necessidade de dividir um ovo ao meio,repartindo com mais alguém.
Num dia assim chuvoso,nariz apoiado na vidraça,olhava a chuva cair,sem parar,entre ventos e raios, estremecia de medo,mas agarrada a saia da mãe querida,nada temia,,sentia a segurança de um barco no ancoradouro.
Nas noites de insônia,com medo do bicho papão,agarrada à chupeta de borracha, que assoviava,ficava mastigando até o medo passar, numa forma de proteção e o medo passava.
Porem um dia o assovio desceu goela a baixo,causando transtorno e medo aos pais,que com precisão mandavam também, goela a baixo,colheradas de azeite, pra expelir o pequeno objeto.
Era tão grande a necessidade daquela chupeta, que demorei a deixá-la.
Só o fiz,quando me foi prometido ganhar do papai Noel,uma sombrinha no dia do Natal.
Essa separação foi sofrida,passei aquele ultimo dia agarrada a chupetinha,como se fora a despedida de uma amiga inseparável.
Sofreu...doeu...passou 
Foi a chupetinha e ficou a sombrinha
Foi uma troca justa ,ou seria apenas pretexto, pra me separar de algo que mais gostava.
Tive também momentos alegres e musicais, ao completar meus quatro anos...
Fui homenageada com uma tocata,com direito a sanfona do ceguinho Tião irmão da Elza, que casou mais tarde com o Ubaldino,o filho da Nha Davina e irmão do João Maria polenta fria,como chamavam a criançada.
No cavaquinho Seu Lóca,o pai do Luiz Mico.
E no clarinete,meu pai.
Que festança...saracoteei e até ensaiei uns passos de dança,na inocência que só as crianças  trazem consigo.
Foi minha primeira e única festa naquela fase da vida,agora distante.
Por volta dessa idade,a morte me rondou pela primeira vez, quando ao passar debaixo de uma cerca de arame na pedreira, dentro de uma gaiota eu e minha irmãzinha Lili.
Ao avistar a vaca furiosa vindo em nossa direção,mamãe puxou rapidamente a gaiota e ficamos agachadas e por um triz, não fomos atingidas pelo arame farpado, pra fugir do animal. 
Agachadas ficamos,enquanto o arame farpado nos ameaçava.
Foi por um triz... 
A partir daí as lembranças começam a pesar, ficam mais sofridas, como o acidente na fabrica do seu Aleixo,sendo jogada em meio as correias. Só a vida me salvou da morte certa.
Tempos depois, numa tarde morna e abafada, correndo em brincadeiras, fui alcançada e mordida na perna, pelo cão chamado jipe do Zé sulino, pai do Mano e Maninho, dupla cantante da difusora, 
Começava ali uma longa peregrinação em busca de medicamentos na Farmácia do Vico, que sempre brincalhão aplicava –me as injeções em volta do umbigo dolorosamente.
Pra compensar tantos dissabores passei a cantar também na Difusora aos domingos no programa Atrações Mirins.
Alem disso, acompanhava meu pai nos bailes de carnaval do Clube do Comercio, onde ele tocava pra ganhar uns trocos extras, depois de um dia cansativo como carpinteiro e pedreiro da Prefeitura de Irati, Ainda tinha fôlego e disposição pra música.
Era compensador, receber e agradecer ao café Irati e as palmas do auditório, naquele presente tão útil ,que levava com carinho pra casa,, pra entregar a minha mãe,que me escutava pelo radio da vizinha.
Vez por outra, recebia uma entrada pra matine do cinema e mais feliz ...ainda mais se o filme era com Elvis Presley,,meu amor platônico
Certa ocasião, ao invés de ficar na platéia,, subi ao palco do Cine Central, pra fazer o coral do seu Adriano Trevisan,cantando seu Chuá Chuá...
Foi e continua sendo a lembrança mais incrível de toda minha vida, por que aquela menininha chamada de mudinha, se superou e desafiou sua própria coragem ao enfrentar uma platéia que lotava os domingos na Difusora Iratiense.
 Atrações mirins era comandado pelo Santoro Neto, mas foi das mãos do seu Alfredo leite, que ganhei o meu primeiro troféu em forma de um disco, que guardo te hoje com imenso carinho.
Ao cantar o Filme triste, jamais imaginaria como seria a vida a partir dali,afinal meu mundo era ali, entre aquelas montanhas e campos verdes.
Desconhecia no vai e vem do trem, outras cidades e sentada a beira da linha, ficava a imaginar, como seria o mundo no final daquela linha ,que se perdia na curva.
O apito que ecoava naquelas curvas, pareciam anunciar uma promessa de nova vida,longe dali
Mas, como se desgrudar da cidade que nos viu nascer, sem sofrer?
E aconteceu então, a descoberta do primeiro amor,e com ele, a decepção causada pela diferença de classes sociais.
Pra compensar, houveram amizades compensadoras no primeiro emprego, que me foi oferecido na Famacia Pessoa.
Inexperiente, sem ao menos saber atender um telefone, fui jogada na arena da vida, pra aprender que na vida ,quanto mais difícil é o aprendizado, mais saborosa será a vitoria
E assim fui, vi e venci ,com a ajuda de duas amigas, que não posso deixar de citar seus nomes, pois muito me ajudaram , estendo-me a mão.
Marica e Terezinha Lopes
Com a separação dos pais coube a mim como filha mais velha amparar e ajudar na criação dos filhos menores 8 ao todos.
Sendo então já uma telefonista da Cia telefônica, fica aqui um registro pra dona Joana e a Charlotte, que muito me ensinaram, na abnegada profissão e da qual, somente saí com transferência, pra Curitiba.
Um novo horizonte se descortinava a minha frente,mas era assustador o novo mundo que se abria, dada a diferença enorme, entre a capital e uma cidade pequena do interior;como a minha Pérola do sul.
Após curto período de adaptação, voltei buscar a todos, trazendo na bagagem somente a roupa do corpo e a confiança em dias melhores, no coração.
Foram longos e árduos os dias que se seguiram na trajetória, que durou mais de 40 anos em Curitiba..
Menos de um ano, minha mãe quis voltar  pra Irati,por não se acostumar na capital,então fui despedida da Telepar ,por não poder mais ser transferida..Diante disso, minha mãe resolveu ficar, e recomeçou pra mim nova batalha, a procura de um novo emprego..
Começou a longa busca por novo trabalho, e algumas vezes, fui a pé por não ter dinheiro pro ônibus.
Arrumei outro como telefonista, que durou pouco, após perder a voz ,acabei perdendo também o novo emprego.
No ultimo dia do aviso prévio, estava chorando baixinho, quando apareceu um anjo em forma de mulher, e me consolou dizendo que me ajudaria a achar outro.
Dito e feito, ela me conduziu pra trabalhar nas lojas HM,,na época uma potência em todo Brasil.
Foi ali na HM,que conheci a melhor amiga de todos os tempos,por ter me levado a conhecer o mar, pela primeira vez,numa excursão a Guaratuba, com uma turma de amigos japoneses, como ela.
Foi uma amizade tão duradoura, que permanece ate hoje, após tantos anos.
Foi trabalhando como telefonista da HM, que, incentivada pela dona Lourdes minha chefe, voltei a estudar, fazendo o segundo grau,30 anos após ter feito o primário no meu querido Duque de Caxias.
Ali também conheci a oportunidade de um novo amor, que morreu junto com a rosa que me deu e não vicejou.
Após um desgaste emocional, perdi a voz novamente, e fui aconselhada a operar as amígdalas,mas de nada adiantou e o resultado foi  perder o emprego mais uma vez.
Novamente, recomeçou a batalha pela sobrevivência.


Publicado por Memórias de uma abelhinha de Irati em 30/01/2017 às 21h02

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